Na crise dos 40 anos, que todo homem passa, muitas vezes arrependi-me amargamente das coisas que eu deixei de fazer na infância e até na adolescência.
Não sabia dizer aonde eu tinha errado pois a meu ver eu tinha feito tudo certo: estudei, trabalhei, desenvolvi uma carreira profissional, etc...
Foi aí que comecei a refletir sobre minhas fantasias, sonhos e invejas infantis.
Em toda minha infância aquilo que me proporcionou maior prazer e sensação de estar vivendo a vida foi justamente a leitura das revistas em quadrinhos Disney.
Através da Internet fui tendo acesso a essas revistas e todo aquele prazer infantil foi retornando.
Confesso também que mesmo ganhando bem na profissão escolhida nunca me senti realmente rico e satisfeito.
Essa contradição entre dinheiro e riqueza que eu sentia me deixava exasperado comigo mesmo.
Depois de já haver acumulado uma quantidade considerável de scans da Disney, renomeando-as e classificando-as em meu PC, comecei sentir uma sensação de ser rico e pensei sobre o assunto.
Descobri, por exemplo, que na infância, como não havia dinheiro disponível, a maior riqueza de uma criança estava no número de gibis que possuía.
Eu invejava muito os garotos cujos pais lhes compravam gibis mensalmente e que tinham caixas e mais caixas de gibis.
Foi aí que percebi o porquê do dinheiro não me satisfazer como símbolo de poder e riqueza.
Eu havia internalizado na infância que riqueza era ter muitos gibis e poder era não ser proibido de lê-los como meus pais e irmãos mais velhos faziam comigo (eu lia às escondidas, é claro).
Enfim, muitas verdades sobre nós vão aparecendo em nossa consciência através da leitura e colecionamento de gibis, mesmo que virtuais.
Muita gente não sabe por que é feliz lendo gibis mas é importante a gente saber pois podemos, dessa forma, recanalizar esse gôsto e preferência para outras coisas também, além de gibis.
Deixo aqui a minha experiência pois creio que ainda existem algumas pessoas que vêem os gibis pela óptica de minha família, ou seja, que gibis enlouquecem, que gibis desencaminham as crianças, etc.
Àqueles que gostam de ler gibis mas sentem alguma resistência interna em relação à esse tipo de entretenimento, acreditem: mais loucos do que já somos é impossível e, por isso, tudo o que fizermos hoje, depois de adultos, concorrerá positivamente para o nosso crescimento e amadurecimento na vida.
Hoje não mais me arrependo das coisas que deixei de fazer na infância.
Muito pelo contrário, orgulho-me de tudo o que eu fiz na infância que concorreu hoje para eu me reencontrar e aprender de maneira prática e racional a ser mais feliz ainda.
Tenho percebido que muita gente que me parece ser feliz na verdade finge-se de feliz, ou seja, recalca em si suas tristezas e procura se anestesiar buscando em ativismos políticos, na hiperatividade profissional,no sexismo, etc. uma fuga dessas tristezas.
No fundo, não somos nós adultos que somos infelizes e sim, aquela criança que fomos e desprezamos por motivos alheios às nossas vontades e que precisamos trazer de volta à consciência para dar um sentido maior às nossas conquistas na vida.
Sem esse simbolismo infantil a nos dourar a vida fica difícil a gente dar sentido às nossas realizações adultas, pois nos ensinaram que tornar-se adulto era aprender a renunciar à infância (um grande erro, por sinal, e que muitos cometeram).
Apenas complementando o comentário acima, lembro-me que em minha casa havia muitos jornais que meu pai comprava e íam acumulando num armário.
Eu então, pegava esses jornais e recortava os quadrinhos, colando-os em um caderno a fim de montar meus próprios gibis, já que ter um gibi para ler naquela época, ao menos para mim, era impossível a não ser esporadicamente.
Nem por isso eu deixei de ler meus gibis porque fui fazendo amizade com colegas na escola que também compartilhavam desse meu gôsto pelos quadrinhos.
Algumas poucas vezes cheguei a achar gibis nos lixos jogados na beira do rio e, por isso, toda vez que eu saía de casa para comprar pão de manhã na padaria ficava olhando os lixos jogados à margem do rio para ver se alguém tinha jogado algum gibi fora.
He, he. Num mundo como aquele com pouquíssimos entretenimentos e os poucos que haviam me eram vedados, o gibi se constituiu numa fonte de fantasias e racionalizações fantásticas que me foram moldando a personalidade e dando sentido à minha vida.
Até mesmo estudar se tornou agradável quando eu me via como os sobrinhos do Donald ou o Gilberto, sobrinho do Pateta, em busca de conhecimentos para me sentir igual a eles.
Muitas vezes, cheguei a recortar os personagens Disney e colá-los em cartolina a fim de usá-los para reviver as aventuras dos gibis e até mesmo inventar novas aventuras através dessas brincadeiras.
Meus amigos que gostavam de gibis naquela época e até sonhavam em possuir algum brinquedo que representasse a cidade de Patópolis com todos os seus personagens em forma de bonecos, acabaram se dando bem na vida e cada qual desenvolveu uma carreira profissional bastante satisfatória e muito parecida com o personagem Disney de sua preferência.
Como eu gostava dos inventores e gênios de Walt Disney tornei-me programador e analista de sistemas.
Um amigo que gostava mais do Tio Patinhas por contar dinheiro, tornou-se contador contábil.
Outro amigo, que gostava mais do Tio Patinhas como coordenador do clã familiar tornou-se administrador de empresas.
Enfim, cada um trouxe para a vida adulta as fantasias que mais cultivou na infância através dos gibis.
O que eu acho engraçado em tudo isso é que eu sou o único a ter consciência da colaboração dos gibis em minha formação na vida.
Esses colegas que claramente seguiram seus personagens nunca relacionaram suas escolhas com essas fantasias e percebo que os mesmos sentem-se insatisfeitos até hoje com suas vidas.
Contando para eles sobre meus gostos por gibis eles demonstraram uma certa aversão por esse meu hobbye dizendo que já passaram da idade de gostarem de gibis.
Coitados! Se eles soubessem que é nesse hobbye que está a resposta para muitas de suas questões acerca do que é felicidade, eles voltariam hoje mesmo a ler gibis.
Luiz Dias:
ResponderExcluirNa crise dos 40 anos, que todo homem passa, muitas vezes arrependi-me amargamente das coisas que eu deixei de fazer na infância e até na adolescência.
Não sabia dizer aonde eu tinha errado pois a meu ver eu tinha feito tudo certo: estudei, trabalhei, desenvolvi uma carreira profissional, etc...
Foi aí que comecei a refletir sobre minhas fantasias, sonhos e invejas infantis.
Em toda minha infância aquilo que me proporcionou maior prazer e sensação de estar vivendo a vida foi justamente a leitura das revistas em quadrinhos Disney.
Através da Internet fui tendo acesso a essas revistas e todo aquele prazer infantil foi retornando.
Confesso também que mesmo ganhando bem na profissão escolhida nunca me senti realmente rico e satisfeito.
Essa contradição entre dinheiro e riqueza que eu sentia me deixava exasperado comigo mesmo.
Depois de já haver acumulado uma quantidade considerável de scans da Disney, renomeando-as e classificando-as em meu PC, comecei sentir uma sensação de ser rico e pensei sobre o assunto.
Descobri, por exemplo, que na infância, como não havia dinheiro disponível, a maior riqueza de uma criança estava no número de gibis que possuía.
Eu invejava muito os garotos cujos pais lhes compravam gibis mensalmente e que tinham caixas e mais caixas de gibis.
Foi aí que percebi o porquê do dinheiro não me satisfazer como símbolo de poder e riqueza.
Eu havia internalizado na infância que riqueza era ter muitos gibis e poder era não ser proibido de lê-los como meus pais e irmãos mais velhos faziam comigo (eu lia às escondidas, é claro).
Enfim, muitas verdades sobre nós vão aparecendo em nossa consciência através da leitura e colecionamento de gibis, mesmo que virtuais.
Muita gente não sabe por que é feliz lendo gibis mas é importante a gente saber pois podemos, dessa forma, recanalizar esse gôsto e preferência para outras coisas também, além de gibis.
Deixo aqui a minha experiência pois creio que ainda existem algumas pessoas que vêem os gibis pela óptica de minha família, ou seja, que gibis enlouquecem, que gibis desencaminham as crianças, etc.
Àqueles que gostam de ler gibis mas sentem alguma resistência interna em relação à esse tipo de entretenimento, acreditem: mais loucos do que já somos é impossível e, por isso, tudo o que fizermos hoje, depois de adultos, concorrerá positivamente para o nosso crescimento e amadurecimento na vida.
Hoje não mais me arrependo das coisas que deixei de fazer na infância.
Muito pelo contrário, orgulho-me de tudo o que eu fiz na infância que concorreu hoje para eu me reencontrar e aprender de maneira prática e racional a ser mais feliz ainda.
Tenho percebido que muita gente que me parece ser feliz na verdade finge-se de feliz, ou seja, recalca em si suas tristezas e procura se anestesiar buscando em ativismos políticos, na hiperatividade profissional,no sexismo, etc. uma fuga dessas tristezas.
No fundo, não somos nós adultos que somos infelizes e sim, aquela criança que fomos e desprezamos por motivos alheios às nossas vontades e que precisamos trazer de volta à consciência para dar um sentido maior às nossas conquistas na vida.
Sem esse simbolismo infantil a nos dourar a vida fica difícil a gente dar sentido às nossas realizações adultas, pois nos ensinaram que tornar-se adulto era aprender a renunciar à infância (um grande erro, por sinal, e que muitos cometeram).
Apenas complementando o comentário acima, lembro-me que em minha casa havia muitos jornais que meu pai comprava e íam acumulando num armário.
ResponderExcluirEu então, pegava esses jornais e recortava os quadrinhos, colando-os em um caderno a fim de montar meus próprios gibis, já que ter um gibi para ler naquela época, ao menos para mim, era impossível a não ser esporadicamente.
Nem por isso eu deixei de ler meus gibis porque fui fazendo amizade com colegas na escola que também compartilhavam desse meu gôsto pelos quadrinhos.
Algumas poucas vezes cheguei a achar gibis nos lixos jogados na beira do rio e, por isso, toda vez que eu saía de casa para comprar pão de manhã na padaria ficava olhando os lixos jogados à margem do rio para ver se alguém tinha jogado algum gibi fora.
He, he. Num mundo como aquele com pouquíssimos entretenimentos e os poucos que haviam me eram vedados, o gibi se constituiu numa fonte de fantasias e racionalizações fantásticas que me foram moldando a personalidade e dando sentido à minha vida.
Até mesmo estudar se tornou agradável quando eu me via como os sobrinhos do Donald ou o Gilberto, sobrinho do Pateta, em busca de conhecimentos para me sentir igual a eles.
Muitas vezes, cheguei a recortar os personagens Disney e colá-los em cartolina a fim de usá-los para reviver as aventuras dos gibis e até mesmo inventar novas aventuras através dessas brincadeiras.
Meus amigos que gostavam de gibis naquela época e até sonhavam em possuir algum brinquedo que representasse a cidade de Patópolis com todos os seus personagens em forma de bonecos, acabaram se dando bem na vida e cada qual desenvolveu uma carreira profissional bastante satisfatória e muito parecida com o personagem Disney de sua preferência.
Como eu gostava dos inventores e gênios de Walt Disney tornei-me programador e analista de sistemas.
Um amigo que gostava mais do Tio Patinhas por contar dinheiro, tornou-se contador contábil.
Outro amigo, que gostava mais do Tio Patinhas como coordenador do clã familiar tornou-se administrador de empresas.
Enfim, cada um trouxe para a vida adulta as fantasias que mais cultivou na infância através dos gibis.
O que eu acho engraçado em tudo isso é que eu sou o único a ter consciência da colaboração dos gibis em minha formação na vida.
Esses colegas que claramente seguiram seus personagens nunca relacionaram suas escolhas com essas fantasias e percebo que os mesmos sentem-se insatisfeitos até hoje com suas vidas.
Contando para eles sobre meus gostos por gibis eles demonstraram uma certa aversão por esse meu hobbye dizendo que já passaram da idade de gostarem de gibis.
Coitados! Se eles soubessem que é nesse hobbye que está a resposta para muitas de suas questões acerca do que é felicidade, eles voltariam hoje mesmo a ler gibis.